O espectáculo de 23 de janeiro, que seria não só a reunião dos LX Comedy Club, mas também uma homenagem a Ricardo Vilão, que morreu em setembro de 2023, continua a dar que falar. Depois das notícias que davam conta dos insultos de Rui Sinel de Cordes a uma espectadora, do cancelamento do espectáculo agendado para 31 de janeiro no Teatro Sá da Bandeira, Porto, e do pedido de desculpas de Sinel de Cordes, chega agora a versão de Salvador Martinha.

Salvador Martinha. "Às vezes, somos muito críticos connosco e não vale a pena porque depois vamos morrer"
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O humorista, que, juntamente com Sinel de Cordes, Luís Franco Bastos e Ricardo Vilão, integrou o grupo de stand-up comedy Lx Comedy Club, desabafou no mais recente episódio do seu podcast, "Ar Livre". "Isto mexeu muito comigo", admite o humorista de 41 anos.

Ainda abalado pelos acontecimentos que tiveram lugar no Tivoli BBVA, Martinha descreveu o sucedido como uma aterragem de um avião "com a asa a arder" e refletiu sobre o impacto que isto teve a nível pessoal. "Eu estava no momento mais feliz da minha vida. Juro-vos. Por isso é que eu estou muito chateado. Eu sinto que subi com dois amigos ao Evereste na altura mais feliz da minha vida. E quando estou lá em cima, de repente levo com um calhau vindo não sei de onde. Caiu-me um calhau na cabeça", afirma.

"Blackout" é a expressão usada por Salvador Martinha para descrever o estado de Rui Sinel de Cordes. "Acabou o espetáculo, fomos para os camarins, demos-lhe na cabeça. Lembro-me de chegar ao camarim. Nunca na minha vida tinha visto aquelas caras no camarim. As pessoas tinham os olhos fora da órbita", relembra, referindo-se à equipa que ajudou a organizar o espectáculo, que deveria ser também de angariação de fundos para a família de Ricardo Vilão.

Martinha e Franco Bastos receberam um áudio de Sinel de Cordes no dia seguinte "a pedir desculpa". Mas o desastre já tinha acontecido. "Falhámos na nossa missão, que era homenagear um amigo", admite, explicando que, face aos acontecimentos, já não fazia sentido fazer o espectáculo do Porto. "Com que cara é que íamos estar, sete dias depois, a contar historias de como éramos felizes em grupo, quando se tinha passado isto agora? Ia ser um espetáculo sobre uma redenção", reflete Salvador Martinha, que decidiu em conjunto com Luís Franco Bastos o cancelamento.

Descrevendo o comportamento de Sinel de Cordes como um "snap total", Martinha chega mesmo a comparar o momento com a estalada que Will Smith deu a Chris Rock nos Óscares de 2022. "O Rui passou-se e tem ali um momento em que descarrega uma energia super negativa, uma raiva em cima de uma pessoa da plateia. Foi um momento em que ele colapsou. Até hoje acho que aquilo foi um blackout", recorda Salvador Martinha.

"A senhora indignou-se, levantou-se, disse que isto era uma vergonha e saiu da sala com as quatro amigas. E ficou um gelo na sala", descreve ainda o humorista, dizendo que o seu instinto, juntamente com Franco Bastos, foi continuar o espectáculo. "Começámos quase um roast ao Rui. O Rui não pareceu acalmar com aquilo, parece que o blackout continuou e continuámos até ao fim. Desde a catástrofe, continuámos mais 50 minutos, uma hora", conta.

"Deixa-me falar, caralho!" foi a frase proferida por Salvador Martinha para conseguir segurar no espetáculo e conduzi-lo até ao fim. "No final tivemos uma standing ovation [ovação de pé] de 7 minutos, completamente desproporcional à qualidade do espetáculo. De repente acabou, as pessoas levantaram-se, tipo flechas", explica, dizendo ainda. "Saímos do espetáculo, o Rui ainda não se tinha apercebido logo. Nós explicámos-lhe e aí ele iniciou um processo de se aperceber do que tinha feito", relembra.