Depois de muitas teorias no Reddit, contagens decrescente nas redes sociais e lágrimas ao rever os episódios mais dramáticos, “A Guerra dos Tronos” chegou ao fim.

Da política ao humor, a MAGG pediu a várias personalidades que vibram com a série que analisassem a oitava e última temporada. O último episódio ficou a cargo do apresentador e argumentista Luís Filipe Borges.

Opinião. Quase 10 anos a anunciar o inverno mais horrível da história das intempéries dantescas, e quando o dito cujo vem… não passa dum resfriado.

Não sei se o leitor é apreciador de caracóis. Em caso positivo, o meu caro sabe bem – lá no fundo, embora evite pensar nisso – que aquela parte escurinha no fim é, não há outra forma de dizer isto, excremento. Porque, ao ferver, e com toda a legitimidade, o caracol borra-se (afinal, quem nunca?). Portanto, maneiras que aquela parte no fim do caracol é merda. Mas nós comemos na mesma.

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Lamentavelmente é a melhor analogia que ocorre ao escriba quanto à Season Finale de GoT, onde houve direito a copos de café e a garrafas de plástico; um Greyworm sobrevivente a tudo, mesmo interpretado por um ator cuja única expressão facial corresponde à que todos fazemos quando seguimos em roadtrip e alguém no interior do veículo solta uma bufa; Arya, após todo um arco de 7 temporadas em crescendo épico, reduzida no último episódio a figuração especial e espécie de antepassada de Dora, a Exploradora; private jokes de envergonhar um argumentista dos “Batanetes”; Jon Snow a inquirir, sem riso, aquela deixa típica de novela – “O que estás aqui a fazer?”; Tyrion a convencer toda a gente sobre quem deve ser o novo Rei e, sem sequer existir mudança de cena, a dizer a esse mesmo Rei que não pode ser o seu primeiro-ministro porque nos
últimos tempos só tem feito aquilo que o caracol faz enquanto coze, enfim.

David Benioff, que fique bem claro, só por ter escrito o guião de “A 25ª Hora”, de Spike Lee, já merece todo o meu eterno carinho. Mas ele e o parceiro esticaram-se ao comprido nesta temporada. Pode ser dos atores quererem partir para outra; pode ser do R.R.Martin falhar deadlines com a editora como o Bryan Ruiz falha golos de baliza aberta; pode ser do que eles quiserem, mas não se admite.

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Um 4º e 5º episódios que, apesar de resolverem plotlines à pressa, ainda assim puxavam para cima, e eis senão quando vem esta espécie de telefilme manhoso à laia de grande clímax – onde a única coisa que vale a pena é Emilia Clarke, a sua personagem, a sua morte, e o seu dragão.

De resto, Kit Harrington passa toda a última parte da aventura com ar de quem está claramente desconfiado de que o seu talento como actor está longe de ser susceptível de o fazer reaparecer como qualquer outra personagem que não Jon Snow.

Um bom quarto de hora (ou mais) de sucessivas possíveis últimas cenas assoberbadas de tentativas de fazer o espectador chorar. Tyrion ocupadíssimo com feng shui antes duma inenarrável reunião do Conselho de Ministros onde personagens outrora fascinantes são reduzidos a
caricaturas boçais. Arya, após um inusitado interesse pelas artes marciais que a levaram a aviar o Night King “out of the fucking blue”, qual ninja da Idade Média fantástica, está de repente hesitante quanto ao futuro mas - como é próprio de jovens naquela idade – admite agora curiosidade pela exploração, trekking e arqueologia.

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Ai estes miúdos… num dia é o futebol no outro já é a dança jazz.

Ah, e os Dothraki – maus como as cobras e, para quem mesmo assim não perceber, com elmos reminiscentes da máscara de Darth Vader (talvez para fazer pendant com o vestido negro haute couture que a sua tirana teve tempo para vestir logo após incinerar King’s Landing).

Bem, foi como o amor, bom enquanto durou. Obrigado do fundo do coração por todas as magníficas memórias, Benioff e D.B.Weiss. A sério, valeu.
E nem tudo são más notícias. Há pessoas que amaram esta última season. Nomeadamente os criadores e argumentistas de “Lost”, que assim deixaram oficialmente de ser os autores do pior final de série de sempre.