Foi há 75 anos, a 27 de janeiro, que milhares de prisioneiros no campo de concentração de Auschwitz foram libertados pelas tropas soviéticas, acabando assim com o Holocausto. Desses poucos sobreviventes, Eva Schloss, meia irmã de Anne Frank, cuja história é conhecida mundialmente através do livro "Diário de Anne Frank", foi uma delas e tudo porque estava a dormir.

A autora do livro "A Rapariga de Auschwitz", lançado em 2018, revelou ao jornal britânico "Mirror" que ela e a mãe, Elfriede, ficaram para trás quando as tropas nazi fugiram dos soviéticos na chamada "marcha da morte". E tudo porque ficaram num "silêncio morto", dada a exaustão que as fez dormir demais. 

Quando finalmente acordaram, sentiram um silêncio estranho no campo de Auschwitz. Nem os cães latiam. “Vimos uma enorme criatura em pele com instrumentos de gelo pendurados, que antes da luz do dia parecia um urso", conta Eva e continua: "Quando se aproximou, percebi que era um batedor russo com um grande chapéu russo. Não sabia falar a nossa língua. Os russos não sabiam sobre os campos, a gaseificação e que éramos judeus. Mas ele olhou para nós e sabia que éramos vítimas".

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Eva tem agora com 90 anos, na altura tinha 15 e já estava no campo há oito meses e lembra que este foi o momento em que voltou a ter esperança. Contudo, "era muito cedo para sentir alguma alegria de sobrevivência", conta. Mas deram-lhes aquilo de que mais careciam: comida. Eva lembra que lhes foram dadas tigelas com sopa de couve e bacon."Comemos, e comemos, e comemos."

Ao contrário de Eva e da mãe, Anne Frank e a sua irmã mais velha, Margot, foram na "marcha da morte" para o campo de concentração Bergen-Belsen, onde acabaram por morrer.

A família de Eva e de Anne conheceram-se num campo de concentração em Amesterdão depois de a cidade onde Eva vivia, Viena, ter sido ocupada por nazis. Foi em Amesterdão que Otto Frank, pai de Anne, e a mãe de Eva, Elfriede, se conheceram, acabando por se casar anos mais tarde.

Eva lembra-se até o dia em que Anne lhe mostrou o famoso diário que Otto lhe tinha dado quando fez 13 anos. "Ela gostava tanto de escrever, adorava contar histórias." Essa é precisamente a última lembrança de Anne, antes de ambas as famílias se esconderem em 1942 e acabarem por ser levadas para Auschwitz em 1944, onde nunca se encontraram.

"Se Anne e Margot não tivessem ido na marcha, teriam sobrevivido", diz Eva ao mesmo jornal, passando a ideia de que tudo poderia ter sido diferente se não tivesse ficado a dormir. Mas esse não foi o único fator que a salvou. A mãe deu-lhe um chapéu de abas largas que permitiu que escondesse a sua idade e fosse salva da seleção para as câmaras da gás: "Esse foi o primeiro milagre", diz.

Além de Eva e da mãe, Otto foi o único sobrevivente da família Frank e aquele que acabou por descobrir o diário da filha. Foi só depois da guerra que Otto e Elfriede se casaram, em 1953.

Aquele que realmente lhe devolveu a vida aconteceu há 75 anos, dia que não esquece e que ainda hoje lembra como uma vitória depois de passar meses no campo imundo e inundado pelo medo.