Não passa uma semana sem que notícias sobre violência doméstica sejam divulgadas pela comunicação social. E os casos continuam a crescer. Mariana Vieira da Silva, Ministra da Presidência, anunciou esta sexta-feira, 22 de novembro, os números de 2019: até à data, já morreram 33 pessoas às mãos deste crime — 25 mulheres adultas, sete homens e uma criança.

Não é raro a morte de alguém em contexto de violência doméstica representar o culminar de uma série de agressões que já vinham a decorrer há mais tempo. Estas ações tendem a esconder-se entre as paredes de uma casa e muitas vezes a vítima não está bem consciente daquilo que está a acontecer. Só que as agressões costumam também escalar e a ganhar proporções muito graves.

Fala-se muito nas vítimas, mas também é importante refletir sobre os agressores. Ainda que seja difícil traçar um perfil exato, a psicologia já conseguiu identificar algumas características mais transversais (e aqui, além da violência doméstica, incluem-se outras formas de violência, como o bullying), explica à MAGG o psicoterapeuta da Clínica da Mente Pedro Brás. "O agressor é uma pessoa igual a todas as outras, que pode ter graves problemas psicológicos ou ter passado por vários momentos traumáticos que condicionaram as suas emoções e ações."

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De acordo com o psicólogo, é importante estar ciente dos traços de personalidade mais comuns, por três motivos:

  • Ajuda a identificar um agressor;
  • Ajuda o agressor identificar-se como tal;
  • Quanto mais informações tivermos sobre os agressores, maiores e melhores são as soluções para este problema e para uma vivência em harmonia.

Na base de todas estas agressões está o desrespeito pelo outro. "E isto tem muito a ver com a educação e exemplos ao longo da vida. Na violência doméstica, nota-se que tanto a vítima como agressor têm comportamentos aprendidos pelos seus pais. É comum a mãe do agressor ou o próprio agressor ter sido vitima de violência doméstica. Ele não aprendeu a respeitar."

Dá-se aqui uma espécie de mimetismo: “Uma vítima de bullying pode tornar-se num bully depois. É quase como se os agressores aprendessem uma linguagem de violência.”

Da carência afetiva, ao consumo de drogas e álcool, estas são as dez características mais comuns nos agressores.

1. Carência afetiva: "Pessoas que têm carência de afetos, que nunca foram amadas ou protegidas. Não conviveram em ambientes afetuosos."

2. Crenças: "Pensamentos errados e crenças erróneas, nomeadamente sobre as diferenças de género. Considerando a mulher ou a criança como um ser inferior, o que por si só justificaria a ação violenta."

3. Dificuldade de comunicação: "Nesta característica enquadram-se dois tipos de agressores: os tímidos, que têm dificuldade em comunicar (medo, vergonha) e os rudes, que só conseguem comunicar através das agressões verbais, gritos e palavrões", explica. "A incapacidade de comunicar e se relacionar com os outros pode levar a comportamentos ofensivos e violentos."

4. Dificuldade em resolver problemas: "Pessoas que têm dificuldade em lidar com os problemas e gerir as emoções associadas aos mesmos podem partir para a agressão com mais facilidade que as pessoas que gerem eficazmente estes processos."

5. Baixa autoestima: "Pessoas que não gostam de si, que não se sentem amadas, que não acreditam no seu valor, tendem a tornar-se desconfiadas e defensivas. Sendo que a melhor defesa é o ataque, as pessoas com estas caraterísticas tornam-se facilmente agressores."

6. Baixa tolerância à frustração: "A incapacidade para lidar com problemas, a intolerância à rejeição e à frustração são características que favorecem comportamentos agressivos."

7. Dificuldades específicas, como ciúmes patológicos: "Pessoas ciumentas, que tem dificuldades em confiar nos outros, provavelmente porque já foram alvo de traições no passado, são pessoas tendencialmente agressivas para os seus companheiros."

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8. Demonstração de machismo: "Homens que viveram em seios familiares tradicionais, com ideias machistas enraizadas são pessoas tendencialmente machistas, com sentimentos de posse e de pertença perante o parceiro, o que pode levar a comportamentos extremamente agressivos e desproporcionais."

9. Álcool e outras drogas: "O uso de substâncias psicotrópicas está frequentemente associado ao perfil dos agressores. Obviamente que estas substâncias alteram a perceção da realidade, tornando, muitas vezes, as pessoas agressivas. Contudo, apesar do uso de substâncias estar intimamente ligado ao perfil do agressor, este motivo nunca pode ser desculpa para a agressão."

10.  Alterações de personalidade: "Características de personalidade como o narcisismo ou a fobia social, são traços associadas ao perfil dos agressores muito frequentes. Este tipo de pessoas tem uma má relação com os outros, não se sabe relacionar", diz.

"Os primeiros porque são fóbicos socias — não gostam de ser o centro das atenções e evitam qualquer tipo de contacto com os outros —  e os segundos, em oposição, porque querem ser o centro das atenções e relacionam-se de forma exagera e invasiva com os outros.  Qualquer uma destas características não é saudável no relacionamento humano, motivo pelo qual pode levar a comportamentos ofensivos como estratégia de defesa."