Será que miúdos de nove anos são capazes de perceber o que é sentir atração sexual por pessoas do mesmo sexo ou do sexo oposto? Será que há consequências do ponto de vista emocional ou nem sequer faz sentido falar disto nesta idade? Segundo Manuel Peixoto, terapeuta familiar, faz todo o sentido abordar a educação sexual desde muito cedo e não há que ter vergonha ou receio de o fazer, mas alerta para a necessidade de uma abordagem coerente face à idade das pessoas envolvidas. "A sexualidade não é um tabu e tem de ser trabalhada desde muito cedo, até na escola. Têm é de ser feita de outra forma e noutros moldes já que requer que se tenha em atenção não só os intervenientes mas também o seu desenvolvimento cognitivo", revela.

Já a psicóloga Marina Carvalho diz que o tema em si pode não ser totalmente desadequado para crianças dessa idade. "Num contexto de investigação onde se pretenda perceber o que significa para uma criança ter uma relação de namoro, pode ser perfeitamente válido colocar este tipo de questões", mas, diz a psicóloga que não se deve esperar que o significado da pergunta seja entendido pela criança da mesma forma que o é por um adulto.

Para o terapeuta familiar Manuel Peixoto é preciso entender que se está "a falar de crianças que têm um conceito da sua sexualidade e da atração pelo sexo oposto, ou pelo mesmo sexo, bem diferente daquela que tem um adulto e é errado pensar o contrário." Mas embora seja necessário desmontar todos estes conceitos e aplicá-los às idades respetivas, Manuel Peixoto não vê problema em perguntar a uma criança se já namora porque isso "é uma coisa de que já todos falam desde os quatro ou cinco anos", mas quando a questão é a atração sexual o tema torna-se muito mais complexo e não deve ser abordado de uma maneira tão leviana.

"Namoram com a mãe, com as miúdas... vão namorando, não é? É diferente. Mas ao falar de atração sexual estamos a entrar numa zona cinzenta onde um miúdo tem mais dificuldades em definir-se com clareza. Quando uma criança vê uma pergunta destas feita dessa forma fica aflita a pensar se alguma vez já terá sentido alguma coisa por uma pessoa do mesmo sexo ou do sexo aposto. Poderá pensar que está a fazer alguma coisa errada e não percebe porque lhe estão a ser feitas perguntas que ainda não sabe responder."

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A questão da atração torna-se especialmente complicada porque é um conceito novo e muito subjetivo para um miúdo tão novo que, segundo o terapeuta, pode sentir-se atraído pelas coisas mais insignificantes e mundanas que um adulto não consideraria atração. "Um jovem pode sentir-se atraído pelo amigo porque este tem uma televisão melhor do que a dele, ou pela colega por ser a mais popular da turma. E o que é isso da atração sexual? Quer dizer o quê? Significa ter uma ereção? Estas são algumas das questões que pairam na cabeça de uma criança que não percebe estes termos quando os vê numa folha de papel e não lhes são explicados consoante a sua idade."

A atitude dos pais, que não têm a obrigação de ter conhecimento científico aprofundado como nós investigadores temos, perante uma situação onde possa existir essa surpresa e um abalo emocional, deverá ser sempre a de tentar normalizar as reações emocionais da criança."

Os dois especialistas concordam no mesmo ponto: este tipo de abordagem pode suscitar sensações de dúvida, revolta e ansiedade na criança por não saber responder sobre um tema que lhe é muito estranho. E enquanto a psicóloga defende que este tipo de questões possam ser feitas por qualquer pessoa, ainda que num ambiente controlado, seguro, e da maneira certa, através do uso de uma terminologia adequada à idade, o terapeuta recorda que é imediatamente a partir dos nove anos que um miúdo começa a ter consciência de si próprio, da existência do outro e da possibilidade de um primeiro contacto com a morte — a noção de que o outro poderá desaparecer a qualquer momento. Se a isso se juntar o tema da sexualidade de forma crua e agressiva, é muito fácil levar à confusão.

*texto publicado originalmente em 2018 e atualizado a 10 de dezembro de 2022.

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