A pílula do dia seguinte é o único método que pode ser utilizado para prevenir a gravidez após a relação sexual desprotegida. Porém, é comum ouvirmos dizer que a toma desta pílula é limitada, não devendo ser usada mais do que duas vezes na vida.

É uma noção partilhada por muitas mulheres mas também por alguns profissionais de saúde, como farmacêuticos e enfermeiros. Mas é mesmo verdade? Fernando Cirurgião, médico ginecologista e obstetra, afirma que não. “Não existem limites. A ideia de que só se pode tomar duas ou três vezes na vida é uma mensagem que se transmite de forma a que esta toma não se transforme num método contracetivo regular, apenas por isso”, esclarece o especialista à MAGG.

Há cada vez mais contraceção em Portugal e cada vez menos abortos
Há cada vez mais contraceção em Portugal e cada vez menos abortos
Ver artigo

A pílula do seguinte deve ser encarada como um recurso de urgência

Ao colocar um número limitado às tomas da pílula do dia seguinte, que não deve ser ultrapassado, os laboratórios e os profissionais de saúde que o fazem acabam por perpetuar uma ideia na comunidade de que este tipo de produtos pode causar consequências na saúde da mulher, por vezes até na capacidade de engravidar — uma desinformação geral, sem que ninguém consiga explicar exatamente porque é que a contraceção de urgência não deve ser utilizada mais do que duas ou três vezes na vida.

Fernando Cirurgião explica que “nas farmácias, por exemplo, também se acaba por pregar essa moral e perpetuar a ideia de que as tomas são limitadas, mas é uma tentativa de passar a informação de que não deve ser uma toma constante, para que não se transforme numa prática comum e no método contracetivo primordial. Na sua génese, tenta-se dar algum ensino”.

No entanto, o ginecologista alerta que, caso exista uma situação de gravidez não desejada, a pílula do dia seguinte não deve ser dispensada. “É claro que tentamos passar a mensagem de que a contraceção de urgência é isso mesmo, uma urgência, mas perante uma situação de que pode ser necessária, é lógico que tem de se utilizar”, esclarece.

Os efeitos na saúde da mulher

Muito antes da saída para o mercado das primeiras pílulas do dia seguinte, a contraceção de urgência já era uma prática comum, recomendada por alguns médicos. “Há alguns anos, aquilo que se fazia como contraceção de urgência era pegar em metade de uma embalagem de uma pílula convencional e tomar seis comprimidos, e outros seis daí a 24h”, esclarece Fernando Cirurgião, que acrescenta que este era um método que estava mais ou menos difundido com as pílulas convencionais “com estrogénio e progesterona sintéticos”.

Com a evolução da medicina, o especialista explica que foi possível criar uma formulação específica apenas com estrogénio. No entanto, estas formulações “causavam imensas náuseas e existia sempre o risco de expelir a pílula através do vómito. Logo aí está uma razão pela qual não se deve abusar deste tipo de pílulas — assumir esta prática como corrente seria um perfeito disparate em termos de sobrecarga do organismo”.

Clamídia. 7 perguntas e respostas para entender esta infeção sexualmente transmissível
Clamídia. 7 perguntas e respostas para entender esta infeção sexualmente transmissível
Ver artigo

Atualmente, o médico ginecologista afirma que a generalidade das contraceções de urgência contêm apenas progesterona sintética, com doses mais elevadas, claro está, do que a pílula comum. “Mas já é melhor tolerável, muito raramente causa náuseas ou sensação de vómitos e já não há uma sobrecarga tão grande em termos metabólicos”. De acordo com dados da Deco Proteste, 25% das mulheres podem sentir náuseas e dessas, apenas metade tem vómitos.

No entanto, a toma destas pílulas pode levar a desajustes e irregularidades do ciclo menstrual e “não deve, de todo, ser utilizada como uma prática habitual pois pode baralhar completamente o ciclo menstrual”, alerta Fernando Cirurgião.

A pílula do dia seguinte não é uma pílula abortiva

Outro mito da contraceção de urgência está ligado à ideia de que esta é uma pílula abortiva, uma noção que está longe de ser verdadeira. “Se já existir uma gravidez a decorrer, a pílula do dia seguinte não vai ter qualquer efeito, não é uma pílula abortiva”, esclarece Fernando Cirurgião.

De acordo com o especialista, o papel principal deste tipo de pílula é o de dificultar quer a fecundação, quer a implantação do óvulo. “A pílula do dia seguinte tem de atuar no local da implantação para tornar o endométrio (mucosa que reveste a parte interna do útero) menos propício à implantação”. Para além dos efeitos no útero, Fernando Cirurgião explica que a toma desta pílula torna o muco cercival mais espesso, criando uma barreira física, de forma a dificultar a viagem dos espermatozoides, para além de modificar a capacidade das trompas da mulher.

“As trompas uterinas têm um papel facilitador para deslocar o óvulo e os espermatozoides. A sobrecarga hormonal pode modificar a capacidade de mobilidade e também pode ter um efeito inibidor na ovulação, embora não seja esse o principal papel da pílula do dia seguinte”.

O médico ginecologista reforça também que os tempos da toma desta pílula são fundamentais. “Quanto mais precocemente se tomar, melhor o efeito. Idealmente, a toma deve acontecer logo após a relação sexual desprotegida e até 72 horas após a relação. Tenho conhecimento que já existem formulações que permitem uma toma até cinco dias após a relação sexual, mas a ideia de que ‘quanto mais cedo, melhor’ deve permanecer”, conclui Fernando Cirurgião.

As coisas MAGGníficas da vida!

Siga a MAGG nas redes sociais.

Não é o MAGG, é a MAGG.

Siga a MAGG nas redes sociais.