Um dos grandes méritos de “The Handmaid’s Tale” é a criatividade do argumento, a coragem da Hulu em ter investido numa série que tem um ponto de partida futurista, com uma sociedade virada ao contrário. “Black Mirror” é também maravilhoso por isso. Os espectadores adoram ser surpreendidos, viajar por histórias originais, como também adoram desligar dessas coisas e seguir as tramas tradicionais de hospitais, polícias ou novelas. Há público para tudo, necessidades das mais variadas, gostos de todo o género.

Quer dizer, mais ou menos. Mais ou menos. É que os tempos que correm fizeram nascer uma nova necessidade, criaram uma rotina diferente na vida de muitas pessoas, sobretudo daquelas que têm filhos ali entre os zero e os cinco anos. São as pessoas que acordam às 6h30 para tratar dos pequenos-almoços e das mochilas dos putos, saem de casa a correr para os deixar na escola a horas, voam para o local de trabalho porque já vão atrasadas, saem do emprego na bisga porque a escola dos miúdos está quase a fechar, vão para casa, tratam do jantar, dão a comida aos filhos, jantam, brincam um bocadinho com eles, história, chichi, cama e aterram no sofá lá para as dez, dez e tal da noite. Estão a reconhecer a rotina? E o que é que se segue? Um diálogo.

— Então, queres ver qualquer coisa na televisão?

— O quê?

— Não sei, um filme qualquer.

— Um filme ou uma série?

— O que é que há aí de novo?

— Não sei. Vou ver.

(segue-se um zapping de 15 minutos pelos vários menus da Netflix, enquanto o outro faz a ronda no telefone pelas redes sociais).

— Acho que esta série é gira.

— É de quê?

— Não sei bem, mas lá no trabalho alguém estava a falar bem disto.

— Pode ser. Quantos episódios tem?

— Hum, acho que são 13.

— De quanto tempo cada um?

— Dos grandes. 50 e tal minutos.

— Não sei se aguento. Mas é melhor vermos já na cama, o que é que achas?

— Sim, pode ser.

Levantam-se e vão para o quarto. Dois minutos depois ele está na cama, de dentes lavados e pijama vestido, com o computador em cima do lombo e a série que escolheram em pausa. Enquanto espera, vai fazendo a ronda no telemóvel pelas redes sociais e vendo uns vídeos de golos da jornada da Liga Italiana ou da Porta dos Fundos. 48 minutos depois, ela chega à cama, após umas doses de desmaquilhante e 12 loções e cremes hidratantes diferentes, cada um com a sua função, naturalmente (e ai de quem diga o contrário).

São 23h28. Ela deita-se, faz uma última ronda pelas redes sociais, liga o despertador no telefone, aconchega-se. 23h51.

— Podes pôr.

Ele desliga a luz e põe no play.

Três minutos depois, 23h54, ainda continuam a aparecer nomes de executive producers da série, e já um dos dois dorme.

— Estavas a dormir.

— Não estava nada.

— Estavas sim. Não queres ver a série?

— Quero.

23h56. Fecham o computador, viram-se cada um para o seu lado.

— Até amanhã, dorme bem.

— Até amanhã.

Isto tudo para quê? Para lançar uma pergunta simples: quando é que se começa a pensar em criar séries com episódios que vão ali dos 3 aos 5 minutos? É que esse deve ser o tempo médio que muita gente aguenta a ver uma série à noite, mesmo que diga que adora séries. Por isso, deixo aqui uma dica às produtoras: em vez de perderem muito tempo a pensar em novas ideias criativas e temas disruptivos, surpreendam pelo formato, que vão ver que vai ser um sucesso. Uma série com 120 episódios de 3 minutos cada um seria a minha cara. Já adivinharam quem sou eu nesta história, certo?

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